[MUNDO LIVRE- RP Pública] Fase Inicial

Pronto. Era o inferno na terna. Adrian não falou nada mais para o casal, apenas tomou de volta sua espada e fechou a cara, os olhos dourados faiscando. Se jogou de corpo e alma na batalha, não mais do que um redemoinho de lâminas e rugidos. Não se importou com o que estava cortando, apenas cortava sem preconceitos. Se aquele era o fim, ele muito bem iria morrer com uma arma nas mãos, e morreria como havia vindo ao mundo, coberto com o sangue de outras pessoas. Entre ataques e defesas ele gargalhava, dançando com facilidade por entre feitiços e lâminas. Viu Elizabeth libertar suas algemas, viu Amel se transformar e viu os sete selos de Ragnarok serem rompidos.

Talvez por isso ele sempre havia mergulhado em cada batalha de cabeça. Nunca havia achado alguém capaz de lhe arrancar a alma do corpo, e os Deuses sabem quantas vezes ele implorou por uma morte decente e um fim a toda aquela dor. Excalibur estava coberta de sangue, tanto quanto ele mesmo, e atrás de si restava apenas um amontoado de carne desforme e mutilada do que haviam sido seus inimigos. Mas ele já não sentia paz em meio a dor da batalha. Parou por fim, olhando o Fim se aproximar na forma de três Deusas, que como se em desrespeito aos mortos simplesmente os trouxeram de volta a vida. Sentiu o sangue sumir de seu corpo, sentiu o peso de seu gume diminuir com a falta de vitae o cobrindo. Tudo voltou a estaca zero e com olhos dourados ele encarou cada uma das Deusas. Não se importava quem eram, o que eram ou de onde diabos haviam vindo. O mundo iria acabar? Para o inferno com essa história.

A espada girou em sua mão e entrou na bainha. Com um chute ele afastou uma mesa, pulando então o balcão do bar e arrancando das mãos de um dos garçons uma garrafa de vodka ainda cheia. - Com licença. - Disse ele sem o mínimo de educação. - Eu preciso de um trago depois disso. - E virou a garrafa nos lábios, vertendo o líquido goela abaixo. Com metade da garrafa sorvida ele parou, rindo e oferecendo-a par ao garçom, que de pronto imitou Adrian. Mas ele não tinha metade da constituição de um dragão, a não por menos vomitou quase tudo que havia tomado logo em seguida. Adrian riu, passando as mãos pelo rosto antes de se encostar na parede, os braços cruzados sobre o peito forte.

Foi quando sentiu o olhar sobre si, e de imediato procurou de onde a presença vinha. A única coisa que ele pode fazer foi sorrir ao ver a pequena, retribuindo o olhar dourado. Deixaria ela ter com sua família, sabia muito bem que ela iria o procurar. Ela tinha perguntas, e ele respostas. - Eu já tive demais por esta noite. - Comentou ele par ao garçom que havia se levantado. O homem concordou com a cabeça e riu, sem entender nada do que havia acontecido. - Acho que ninguém vai ligar se eu pegar isso. - Adrian disse enquanto surrupiava uma garrafa de vodka para debaixo do braço e se afastava do lugar a passos largos, indo em direção à porta do grande Salão.

mundo finalmente encontraria seu fim. Os anúncios da Mãe calaram o demônio de formas que sequer os selos de Ragnarok seriam tão capazes, por mais que Amel temesse a pureza da espada. O que era reinar num reino finito? Que lhe adiantava sugar todas as almas da Terra, se em breve não haveria Terra para isso? Como sobreviveria o lorde assassino sem vidas para tomar? A quietude de Amel era também a quietude do inferno. Legião alguma se manifestava. Sequer era preciso reinar em qualquer das dimensões, iluminadas ou sombrias, para ensudecer-se com o silêncio diante do fim do mundo. - Todos saúdam o rei. - Vociferou o diabo, num sussurro velado. Observou seus vampiros e criaturas arredarem, numa reverência fraca, e voltarem às suas formas controladas, intocados, ajoelhados diante da Mãe. Quem era Amel perto da senhora da Morte? - Foi um prazer revê-la, mamãe. - Foi tudo o que direcionou à Ganges, num sorriso vazio. E então, todo o seu espectro, seu tamanho descomunal, o miasma negro que envolvia-lhe retrocedeu, sumindo em pleno ar, como se evaporasse de volta para o antro do qual fora invocado, deixando o corpo do francês para trás, ao chão.

Ewan d'Lioncourt arrastava-se do fundo de si mesmo, deixando a escuridão para trás. A luz indicava-lhe a saída, abandonando seu frio coração. Cada passo, cada nervo agarrado, cada centímetro a frente era a certeza de que voltaria a existir o fazendo lutar por seu próprio controle. Sentiu-se tonto, a luz embarcou-o, e deixou-se levar mais uma vez por ela, pela primeira vez percebendo o silêncio das gargalhadas de Amel.

Quando abriu os olhos, avistava a Rainha. O foco voltou-lhe muito aos poucos, os sentidos ainda primários ao peso do ambiente. Ao fundo, via ainda Warren Coleridge, o Lobo Branco. Seu cheiro foi a primeira coisa que chegou ao vampiro, forte como se fosse acordado a tapas de seu torpor. Moveu-se, tentando sentar, e conseguiu, depois de alguns patéticos e longos segundos de tontura e enjôo. A presença de Apollyon foi a segunda coisa que sentiu, quente e ameaçadora. Entretanto, sua agressividade não parecia atingir Ewan, não tanto quanto o cheiro do lobo. Era curioso. O silêncio de Amel indicava que o diabo o havia deixado em paz, e que sequer se opunha à presença divina. As luzes foram a próxima coisa que o tomaram, e o vampiro enfim levantou o rosto pálido para vislumbrar os portais.

Se houvesse ar, não o teria nos pulmões. Se houvesse fé, teria perdido-a. Se houvesse medo, estaria repleto. Mas o que não lhe faltava era o arrebatamento pelas criaturas. Matter, Gaia e... Ganges. Conhecia seu nome como se fossem o seu. Deusas, entidades, aparições. Ainda estava confuso enquanto tomavam suas formas terrenas. E então, em um baque violento, a tontura o atingiu uma nova vez, as vozes da Mãe ecoando dentro de seu peito morto. "Fim do mundo, término dos tempos, anos finais". A criança, o pergaminho, as dimensões... Tudo o atingiu sem piedade alguma de seu despreparo. Recusou-se a ouvir, concentrando-se em seus pés e braços, forçando-se a levantar.

- Elizabeth - Foram suas primeiras palavras, os olhos azuis vasculhando o salão com desespero. Buscava seu cheiro, implorava que a encontrasse. Para onde a tinham levado? Como puderam ter a audácia...? - Argh! - Gemeu contra a vontade, sentindo uma dor excruciante nas fibras de todo o seu corpo. Sentia-se sedento, a boca estilhaçada, as forças drenadas. Não importava. - Elizabeth! - Chamou uma outra vez, mas sua voz era inaudível perto da importância da Mãe e de seus filhos indo a sua busca. Mas ele só queria ela, sua amada. Sua Elizabeth.

Encontrou-a pouco tempo depois, vagando pelo salão como... Um morto. Os passos erráticos, a voz quebrada. Já não era mais nenhum rei, tampouco príncipe. Agora era só Ewan d'Lioncourt, o senhor de nada. Teria ela o encontrado? Estava confuso. Mas lembrava-se ainda de seu toque, de suas mãos. Lembrava-se de que ela o conduzia, seus braços o apoiando, seus pés mostrando o caminho. Sentia a luz bater em suas costas enquanto afastavam-se do salão, duas sombras renegadas, dois demônios perdidos, apaixonados. Que se dane tudo, pensou ele, entregando-se ao oblívio. Ele a tinha consigo, e isso era tudo o que bastava, até o fim dos tempos.

Ele apenas fechou os olhos e sorriu ao ver a pequena já ao seu lado. - Mais rápido do que eu pensei. - Comentou ele com calma, saindo pelas portas do salão em passos lentos enquanto guiava a garota pelo terreno já bem conhecido. Não queria que Hinata viesse correndo lhe puxar a orelha ou começar e lhe xingar por algo que ele não tinha culpa alguma. - Damas primeiro. - Murmurou ele com um sorriso suave, tomando entre as mãos o véu da realidade e o rasgando como se estivesse a abrir uma porta dupla. O rasgo negro se contorceu e logo assumiu cores e formas. Do outro lado, trovões rugiam em um céu escuro, delineando a fortaleza que mais se assemelhava a uma única montanha.

Adrian deu espaço para que ela passasse para o outro lado do portal, que nada mais era do que uma versão muito mais antiquada de aparatação, e seguiu logo atrás dela. Para Angband. Para onde a Luz não poderia os tocar e a escuridão reinava a sua maneira drástica, mas justa.